quarta-feira, setembro 24, 2008

sexta-feira, agosto 01, 2008

Eu-sô-rio.

Ó rio que corres por entre as pedras!

Foges da turbulência da tua nascente.

Jovem, com pressa em ser grande,


Não sabes que no fim da tua corrida,

Serás mar salgado, enorme, pesado e turbulento?


E que importa ao rio que, grande se desfaz,

Que se entrega de braços abertos ao oceano, em paz.


Terás memória suficiente para reconhecer

de que nascente és filho permanente?


És livre quando rio.

Corres desde fio

Até mar solto, profundo, frio.


Quantas vezes visitaste a nascente!

Diferente de ti sou, eu que embora quente,

Sou superfície sem espelho, tão indiferente.


Só corro, lento, parado por vezes.

Sem certeza de que mar será meu fim.


Diferente de ti, sendo eu água de ti,

Choro-te já turbulento, salgado, sem lamento.

Profunda tristeza nesta melancolia tranquilamente indiferente.


Eu, rio, sou mar e sou desalento.

Cada dia que se acaba eu aumento.

terça-feira, junho 10, 2008

Etnologia




Etnologia Todos os anos, fazemos uma viajem pelo espaço. Literalmente. Damos a volta ao sol em 365 dias mais seis horas e mais qualquer coisa em minutos e segundos. Alguém se dá conta disso? Passamos os dias a tentar perceber a mais velha de todas as leis, a Lei da Sobrevivência, e esquecemo-nos de que é a viagem em torno do Sol que nos mantém em movimento. A única verdadeira e Global viagem é aquela que fazemos todos os anos. Em torno do Sol, vamos girando como num carrocel de feira, ignorando o tempo e o espaço, as suas múltiplas dimensões, ora menor ora maior, ora mais perto ora mais longe, ignorando por completo as diferentes velocidades que o mundo contém. Temos uma imagem do nosso passado, individual ou colectivo, projectada num espaço, a Terra, num tempo, o da Cultura. Parece que nos esquecemos que a viagem vai mesmo terminar. Obedecemos mais facilmente a outros homens como nós do que às Leis Universais. 

A imagem que fazemos do futuro, ainda está presa pelos constrangimentos do nosso passado, sem entender o que se passa no presente. Viajamos às cegas, pensando que estamos parados.




quarta-feira, junho 04, 2008

Adamada

Adamada

.rasnep ervil od siaidnum soduef soa ecaf
oudívidni od oãçatrebil ad avitarran a odal
etse araP. No centro o indivíduo. Para este
lado a narrativa do mercado, capitalista,
aniquilador da liberdade de escolha,
conducente ao monopólio.

sexta-feira, abril 04, 2008

Longe...

Em estado de euforia,

Queria testar o desalento

Lembrei-me de recorrer à poesia

Como forma de fugir deste tormento


Longe do estado habitual, poderia?

Aproveito para espalhar ao vento,

Vozes infectadas com douta alegria

Deste lugar em que hoje me sento.


Toca o telefone, atende a velhinha.

Queria alguém mais novo, que fazer!?

Atende uma voz simpática, vizinha.


Posso pensar neste fado e cobri-lo de prazer

Ajuda a ganhar palha para levar a vidinha

Desta ou d'outra forma, estou longe do meu ser.

terça-feira, abril 01, 2008

Em construção II

Todo o mundo e o resto que é nada...

Em construção...

Ah! Poema da minha alma...

Não

Turvo.

Pesado.

Arrastado.

Pendurado pelos suspensórios no ponteiro das horas.

Ainda se fosse no dos segundos!

Nem alucinante viagem nem pausada alegria.

Avanço, por sentir alvescer o pêlo, sei-o.

Cruel tortura. - A hora que não passa!

- Já de nada serve lamentar o avanço, sei-o.

Não servirei para estudo de historiador,

seria uma tarefa monótona, vazia.

A carcaça a ninguém servirá.

Nem abutres em repasto a quererão.

Na marquesa também não me encontrarão.

Vivo sou um peso e depois disso um peso.

Não quero sair deste ano em que completo 35

sem me erguer mais uma vez.

sábado, março 29, 2008

INAUGURAÇÃO

Nós que aqui estamos
Esta praça inauguramos
Vós que cá não estais
Queira Deus que vos salvais

Em honra de Zeca cantamos
Nesta praça estranha dançamos
Os primeiros sempre fomos
Os melhores de vós somos

Neste dia consagrado
O nosso registo fica marcado
Inaugurada praça estás
Por esta gente capaz

INAUGURAÇÃO LUMINOSA

Sombra enfim aqui chegaste
Filha da LUZ que nos faz
Seja este o dia em que por fim
És inaugurada pelo Querubim

sexta-feira, março 07, 2008

O ser dentro de si

Surrealismo.
Perto do real.
Perto ou longe?
O perto que se afasta...
como quem foge,
de si. A sua imagem gasta
ouvi que morreu hoje
lê-lo mesmo sem percebê-lo. Vive. Basta.

26-11-06

Saiu. Não pretendia voltar mais.
A sua capacidade para viver tinha
excedido o limite aceitável.


O ser dentro de si existe.
Cérebro, frio.
Coração, vazio.
Músculos tesos
Ossos presos
A pele, solta, viçosa, é o tudo
que prende o ser dentro de si.
O que lhe dá forma é a memória
que de si tem.

terça-feira, janeiro 08, 2008

Olhares Celestes

Duas toupeiras viviam debaixo do meu quintal.
Sempre viveram de costas voltadas.
Uma debaixo das rosas, a outra do pinhal.
Era a sua cegueira o que as mantinha separadas.

Soprava, certo dia, um vento tão forte.
Que desnudou as roseiras e os pinheiros levantou no ar.
Mas o que de mais lhes tinha trazido era má sorte.
Estavam as toupeiras na horta sem mais nada o que cheirar.

Quis a crueldade do cúpido vê-las casadas.
Vénus foi convocada e chamou-as ao altar.

-Ó toupeira que de rosas te cobres,
Diz-me como te posso agradar?
-Ó Deusa do amor, se tanto me concedes,
Quero ver. Não me serve mais cheirar.

-Ó toupeira que a pinhas me cheiras,
Conta-me como te posso presentear.
-Ó ser alado, por amor assim o queiras.
Abre-me os olhos. A minha amada quero olhar.

Viram-se enfim as duas toupeiras.
Logo os espinhos e as agulhas começaram a picar.

terça-feira, novembro 13, 2007

Imortalidade

Negra. Fria. Sempre. Simplesmente densa.
Monotonia descentrada. Claramente imensa.
Pacífica. Potencial integro. Quimicalidade
primordial. Naturalmente não-viva.
Toda a robustez caracterizadora desta velha
rocha imortal, desaparecerá um dia no
momento em que o último golpe do
vento marítimo agreste a varrer definitiva-
mente como a poeira momentânea.

sexta-feira, setembro 14, 2007

Boa companhia!

“ Quando ando sozinho, só eu e aquilo que me acontece é que ficamos a saber aquilo que me acontece.”

João 2005

01/01/07


Falam em voz baixa, quase sussurrando. Entre os dois, decidem o que vão pedir, aguardando pela chegada do empregado.

A sua aproximação à mesa foi curiosa, diferente.
Junto à mesa havia apenas uma cadeira. Um olhar demorado levou o homem a procurar uma outra para completar o quadro.

Ficou implícito no olhar desolado da senhora que era tarefa para o seu acompanhante. O marido.
Com a cabeça inclinada para o chão deu dois passos na direcção de uma cadeira recentemente abandonada. Pegou-lhe com ambas as mãos e ergueu o corpo deixando os braços esticados. Dirigiu-se então, com passos miudinhos e com a cadeira à sua frente, na direcção da esposa que o aguardava ainda de pé.

Tendo então a esposa decidido sentar-se na cadeira que os esperava, foi ternurenta a mudança de expressão que se lhe estampou no rosto. De um ar subserviente e amestrado de pessoa bem comportada adquiriu então aquela expressão de felicidade. Tinha composto o quadro.

Apenas os seus pedidos tardavam. Valia bem a espera. A cidade abria a noite.

Possibilidade Imaginada

Noite escura. Rio dormente. Negro.
A ausência da luz que te revela
Traz-me a possibilidade
De te imaginar. Aí. Firme, presente.
Correndo discretamente, ora para cima,
ora para baixo. Não o revelas. Apenas
sei que aí estás. A minha luta
por esquecer que a morte está presente
de dia e de noite obriga-me a
tomar por certo a tua existência.
Assim como os fantasmas existem
na possibilidade imaginada.

Corro. Salto as barreiras. Vivo e morro
em cada dia. A meta não é
um objectivo. A experiência de cada dia
basta-me.

Escuro total. Silhuetas perfeitas.
A noite torna-se a manifestação do
mundo sem sombras. Sentimos
essa falta e achamo-nos
abandonados.

Há uma hora em que somos avisados.
- Repara como eu sou livre.
- E por breves instantes ela desaparece
sob os nossos pés. Na maior parte
dos dias estamos desatentos ou
ocupados demais para ouvir o aviso
é chegado o momento do crepúsculo.

- Tornas-te enorme, fina, poderosa.
Mais do que nunca a sua presença
transmite-nos aquele sinal de
segurança. Como um anjo da guarda.
De repente some-se. Para onde irá?
Para leste. Esse oriente saudoso.
Origem da nostalgia que nos
embala e nos espreme a alma.

A sombra escura é aquilo que define
o dia. A noite é apenas a sua
ausência.

Setúbal é um presépio. Apenas
há lugar para um São José, uma
Maria, duas ovelhas, um burro, uma
vaca, três reis Magos, etc..
Todos os lugares estão tomados.
Não necessariamente pelos melhores
representantes.

quinta-feira, setembro 13, 2007

Rainbow Warrior

No jornal da sua morte não morreu o caçador.
Recorda-se a criação verde, pela paz, de que foi pai com amor.
Não haverá a partir de hoje outro arco-íris igual.
Em todos irei procurar, para além do espanto absurdo com o truque dos elementos, o arco que ele usa para perfurar alguns vilões.
Estarás sempre entre os tons que compõem essa cromática ilusão.
Bob Hunter morreu. Os guerreiros não.

@ Graça

“ Quando chegar a minha vez de ir para Nova Iorque será para publicar livros. Muitos.”

Ela senta-se com um bloco de notas e uma caneta e assim, cria as suas histórias. Quando li, num jornal de domingo, esta revelação do seu método, de imediato fiquei com a sensação de que é clara a vantagem do bloco de notas. Hoje, ao reparar na companhia momentânea da mesa ao lado, nota que também ela usa um bloco de notas, com espiral à cabeça. Fiquei de imediato com vontade de escrever. Como ela. Como ele.

Como é desordenada a construção em Lisboa. Entre amarelo, branco, e cor de tijolo, Amontoam-se sonhos de vidas que nem sempre podem sonhar. Nem sempre têm tempo. Como uma trave mestra que suporta o telhado, aberto para o céu, o tabuleiro da ponte limita os que não sonham. Aqui.

Se eu pudesse, traçaria em papel e com carvão, um sonho por casa, por telhado onde habita um coração.
Mas são tantas as janelas, fechadas pela mão, que não mais fecho os olhos, fujo da escuridão.

Últimos Dias de 2004


Todos os miradouros são deslumbrantes. Os que até agora conheci, pelo menos. Aqui, no miradouro da Sr.ª do Monte, sinto o apelo para escrever. Começo por um cigarro. Tiro do meu saco um livro. Entrar nos lugares, bem como a viagem no tempo que a leitura nos proporciona, é o suficiente para despertar em mim o apelo pela escrita.

Com os olhos na ponte, ladeada pelo sol que se despede, percorro o horizonte em busca de sinais que desencadeiem a torrente eléctrica que desperta os alvéolos da memória. Igrejas, o Castelo, a outra margem, o rio, o Cristo, a ponte, o Sol-posto, nuvens, arautos de tempestades, na direcção do mar, a Estrela e depois a cidade que se deita abaixo da linha do horizonte.

Começam a aparecer as primeiras luzes. De um momento para depois, a cidade fica salteada por pequenos pontos amarelos, lembrando luzes de velas imperturbáveis pelo vento que, no cimo do monte, me traz o frio da noite. Aqui e à minha volta, sou acompanhado pelos visitantes que procuram aprisionar uma recordação na película ou nos pixeis das máquinas fotográficas. Para infelicidade sua, apenas conseguem capturar uma finita fracção de horizonte. São belas as fotografias que têm horizonte. Mais tarde ao rever na memória as fotografias pedidas a quem os acompanhava no momento, será sempre decepcionante a comparação com a sensação experimentada. Sem o cheiro a pinho, o som ténue da cidade, dos ramos a dançar ao ritmo dos suspiros de zéfiro, do badalar nas igrejas, do choro de quem sobe ao monte para rezar e assim se aproximar mais de quem partiu e reside agora junto da imagem da Senhora do Monte.

O céu, ponteado por pequenos cirros, rasgado por gaivotas e queimado por aviões, adquire então a imagem de uma zona espectral própria da hora. O vermelho seguido pelo laranja, amarelo, verde, azul, acabando num violeta que se levanta nas minhas costas.

Vista do cimo do monte, a iluminação natalícia que de especial tem o facto de poder ser vista do espaço – resta saber por quem – torna-se assim insignificante quando comparada com o presépio que é a cidade cada vez mais abandonada pelo regresso a casa.